sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

SAUDADE DA IGREJA

Hoje acordei saudoso. Acordei com saudade da igreja. Saudade da “aurora da minha vida” espiritual, daquele tempo que a igreja era composta de gente simples, sem tanto glamour, da igreja do órgão e do piano (as mais sofisticadas), dos hinos do velho e bom Cantor Cristão, e até das brincadeiras que os assembleianos faziam, dizendo que a única coisa que batista tinha de cristão era o cantor (uma alusão ao fato de as irmãs batistas usarem maquiagem, cortarem o cabelo e vestirem calças – todas estas atitudes tidas como não cristãs). Saudade da velha briga doutrinária sobre os dons, sobre línguas estranhas. Saudade da radicalidade da conversão e do ardor missionário. Saudade da ética protestante e dos frutos reconhecidamente evangélicos, onde até e principalmente os de fora reconheciam a lisura, a integridade, a pureza como sinônimos de irmão.
Sinto saudade dos pastores apaixonados pelo rebanho, de gente que se deu, que morreu sem estar preocupado com sua própria segurança e com o seu próprio bem-estar, contanto que o Evangelho chegasse aos confins da terra, gente cujo foco estava em ganhar os perdidos, bem diferente dos pescadores de aquário deste tempo cujas igrejas podem até inchar, mas que nenhuma diferença fazem para os que se encontram perdidos. Saudade dos obreiros incansáveis, trabalhando de sol a sol (II Tm 4:2) visando alcançar os perdidos, bem diferente dos preguiçosos que optam pelo caminho mais curto e confortável de alcançar os já alcançados. Saudade dos líderes firmes que conduziam o rebanho não ao sabor do mercado ou da última onda, mas por princípios, ainda que isso significasse antipatia. Saudade dos grandes oradores de outrora que embora tocassem em temas tão densos, conseguiam manter a audiência extasiada, saudade dos sermões sobre o céu e as delícias do porvir, bem diferente do psicologismo e da teologia de confissão positiva tão comum em nossos dias.
Sinto saudade tal qual o Senhor sentia da igreja de Éfeso (Ap 2:1-8). Saudade porque tais marcas ficam a cada dia mais raras. Saudade porque se comparo a igreja de outrora com a de hoje parecem se tratar de entidades, organizações e de organismos absolutamente diferentes.
Agora me lembrei da parábola do Rubem Alves sobre jequitibá e eucalipto. “Uma vez cortada a floresta virgem (de jequitibás), tudo muda. É bem verdade que é possível plantar eucaliptos, essa raça sem vergonha que cresce depressa, para substituir as velhas árvores seculares ... Para certos gostos, fica até mais bonito: todos enfileirados, em permanente posição de sentido, preparados para o corte. E para o lucro ... Jequitibá e Eucalipto, não é tudo árvore, madeira? No final, não dá tudo no mesmo? Não, não dá tudo no mesmo, porque cada árvore é a revelação de um habitat, cada uma delas tem cidadania num mundo específico”.
A igreja cresceu, ocupamos os lugares de honra na mesa do rei, ocupamos posições importantes na sociedade, estamos presentes em todas as esferas de poder, mas estamos perdendo o nosso lugar no Reino, o nosso castiçal está se apagando (Ap 2:5). Somos uma igreja que cresceu e chegou a números inimagináveis, somos mais de 30.000.000 de evangélicos no Brasil, mas já não vivemos em comum, já não temos uma só alma e um só coração (At 4:32; 2:44). Não somos mais a igreja periférica e pobre.  Como atribuise ao diálogo entre Thomaz de Aquino e Inocêncio IV "já não podemos mais dizer 'não tenho ouro, nem prata', mas também já não podemos dizer 'levanta-te e anda”. Deus tenha misericórdia de todos nós e nos faça voltar ao primeiro amor.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

VERGONHA DA OPBB

Acabei de receber a notícia de que a OPBB aceitou a filiação de pastoras cujas filiações ocorreram até janeiro de 2007, as demais continuam barradas.
Eu nem sei como classificar tal decisão. Está oficializado que a questão não é mais de entendimento bíblico. Já não há mais contestação bíblica de que mulheres possam ser chamadas por Deus, de que a vocação pastoral também pode ser para mulheres, a menos que alguém diga que Deus chamou mas somente até o ano de 2007 e que as chamadas posteriores estão fora do decreto divino, cujo prazo expira em janeiro de 2007. Talvez alguém queira me convencer de que a decisão de agora é um avanço, mas que precisamos respeitar as regras democráticas e portanto a decisão de 2007 (Florianópolis) precisa ser respeitada até que possa ser legalmente revogada. Se assim é, que se diga, que se seja explícito.
Pra mim fica cada vez mais claro que o que está em disputa é a reserva de mercado. Durante anos, nós, os machos, tivemos este direito e não estamos dispostos a abrir mão e deixar as mulheres entrarem na concorrência. Não queremos abrir mão de ajudadoras tão leais e tão competentes, que agora passam a concorrer conosco.
Fica cada vez mais claro pra mim, que apesar de grande parte dos pastores já terem entendimento de que este é um caminho sem volta, de que as mulheres não são concorrentes, mas parceiras, companheiras. Ainda há alguns que estão dispostos a lutar até o fim para que as mulheres continuem privadas dos seus direitos. Alguns que, a julgar pela decisão de agora, possuem uma força extraordinária na estrutura denominacional a ponto de impedir o reconhecimento, ainda que tardio, que para Deus não há homem, nem mulher ... e o direito de exercerem o dom que lhes foi concedido por Deus.
A estas mulheres, bravas guerreiras, desbravadoras, pioneiras e amigas, que apesar de tamanho descaso, continuam na luta, leais, idôneas gostaria de falar (embora sem autorização expressa) em nome de todos quantos as admiramos, as reconhecemos e nos orgulhamos de estarmos fazendo parte do mesmo exército, lutando a mesma peleja, gostaria de lhes pedir desculpas e como dissse Jesus pedir que nos perdoem porque não sabemos o que fazemos. Somos apenas "meninos amedrontados".
Eu que sempre me orgulhei de ser batista, que sempre levantei a bandeira do envolvimento denominacional, hoje digo de forma bem triste, tenho vergonha da minha ordem, tenho vergonha de pertencer ao rol de membro desta ordem. Mas confio que em breve recobraremos a nossa lucidez e celebraremos a chegado de um novo tempo, apesar de um "velho" presente.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Haiti

“Nada é tão ruim que não possa piorar”. Os haitianos hoje sabem que esta é uma afirmação absolutamente verdadeira. O país mais pobre das Américas e um dos mais pobres do mundo foi surpreendido por um terremoto avassalador, 1 milhão de desabrigados, 70.000 sepultados em valas comuns, podendo chegar o número total de mortos a 200.000, um novo tremor de terra e mais vítimas, e agora a ameaça de epidemias de tétano, gangrena e outras doenças infecto-contagiosas. A vida que já era muito difícil ficou ainda pior, quase insuportável.
Não bastasse isso, aparece ainda um Cônsul Insensato fazendo insinuações de que tal tragédia seria resultado das opções religiosas dos haitianos e da maldição que acompanha os afro-descendentes, algo do tipo: isso é uma punição divina, afinal quem não vai pelo amor, vai pela dor. E pior ainda é que tem gente, que se considera de Deus, e concorda com tal insensatez. Primeiro devo dizer que a África não é um continente maldito e que a religiosidade africana é tão lícita quanto qualquer filosofia oriental, ou religião anglo-saxônica, portanto o seu povo não pode ser visto como mais maldito que povo nenhum da terra. Em segundo lugar, fica difícil aliar esta visão com a pessoa bendita de Jesus, que nos ensina, que a misericórdia de Deus é tão grande, que Ele é tão bom que faz com que a chuva e o sol alcancem tanto bons quantos maus. Fica difícil aliar a visão de um Deus tirano que tira a vida de 200.000 pessoas de uma única vez, incluindo ai crianças e inocentes, como forma de dizer às pessoas que Ele as ama. Fica difícil acreditar que o Deus que nos ama, a ponto de enviar seu único filho para morrer pela humanidade, seja o mesmo capaz de tamanho genocídio. Definitivamente nem o Cônsul nem aqueles que concordam com sua afirmação tem autorização divina para falar em nome dAquele que é conhecido como AMOR.
Fico imaginando como um órfão haitiano, cuja família foi inteiramente dizimada, pais, irmãos, primos, tios e avós, além de muitos amigos, receberia a notícia de que tal sofrimento seria ato, decisão de um Deus que o ama, e que causou tamanha dor para puni-lo por não lhe amar.
Em nome do Deus da revelação, do Pai de Jesus, dAquele que me arrancou das trevas para a sua maravilhosa luz, gostaria pois de propor um novo jeito de falar a velha frase: “quem não vem pelo amor, vem pela dor”. Gostaria de dizer à você que sofre e àquele haitiano órfão, que perdeu a sua família e amigos que esta grande tragédia é resultado de um ato natural, resultado da acomodação das placas tectônicas, que foi realmente uma grande tragédia, uma grande dor, e que atingiu também o coração amoroso de Deus. Gostaria de lhe dizer que mesmo quando todos tiverem se esquecido e a vida no Haiti voltar “à normalidade” Deus ainda estará ali ao seu lado, disposto a tomá-lo no colo, enxugar as suas lágrimas. Gostaria de re-afirmar que Deus o ama, que suas lágrimas, seu choro, sua dor tocam o coração de Deus, que por pior que seja a situação que esteja passando, você tem um Pai que continuará do seu lado, todos os dias da sua vida. Gostaria de dizer que “quem não vem pelo amor, vem na dor”, ao perceber que quando todos se foram, Deus permanece ali, lhe amando apesar de tudo.
Para encerrar gostaria de pedir a todos aqueles que já têm um coração como o de Jesus, que levantem um clamor à Deus pelo povo do Haiti, por aqueles homens e mulheres que padecem tão grande dor.