quinta-feira, 14 de março de 2024

MÁQUINA DE MOER REPUTAÇÕES



Foi lançada uma série documental que promete revelar a máquina de moer reputações e quem são seus operadores. Na era da pós-verdade é fundamental que sejam denunciados os maquinadores e financiadores desses entes diabólicos. Aproveitando a ocasião quero surfar no tema e dizer que essa indústria é mais antiga do que se pensa. Tem sido uma tendência colocar o nome das leis que combatem crimes a partir de casos e vítimas emblemáticas, venho sugerir que se faça um reconhecimento de Maria Madalena como a patronesse ou padroeira de todos os que tiveram as suas reputações moídas. Justifico, afirmando que nenhuma outra personagem teve a sua reputação manchada por tanto tempo como esta nobre senhora.

Já passaram mais de mil e quinhentos anos a calúnia do suposto adultério de Madalena. Sabedores da sua liderança no corpo apostólico e com receio que isso inspirasse outras a invadir o espaço reservado aos homens na hierarquia da igreja, era fundamental manchar a sua honra e a sua história. Assim nasce, séculos depois da sua morte, a má-fama de adúltera. Qual a base documental ou testemunhal de tal fato? Uma meia-verdade, distorcida e pronto a máquina de moer reputações estava operando. Assim Madalena virou sinônimo de adúltera. Havia uma mulher apanhada supostamente em ato de adultério e perdoada por Jesus e havia uma seguidora chamada Madalena, pronto era só sobrepor as histórias e de uma meia verdade se faz uma mentira completa. Séculos de acusação e ninguém parecia se importar em investigar a verdade, que estava bem ali nas páginas dos evangelhos.

Só quem morreu na fogueira sabe o que é ser carvão e assim é inegável que esta vítima e sua história milenar pode servir como símbolo de combate as milícias que destroem reputações que são construídas por toda uma vida. Tendo reconhecida a nossa patronesse, quero destacar que a máquina só funciona porque além dos seus operadores e financiadores, há os consumidores. Muita gente mansa, caridosa e com reputação acima de qualquer suspeita, em nome dos seus valores age como consumidor de reputações moídas, que são servidas na mesa de jantar diariamente.

Na sociedade das subcelebridades parece que as únicas reputações que interessam são aquelas expostas na mídia. Mas há máquinas portáteis tão destruidoras de reputações quanto aquelas do escritório do crime, com a diferença de que seu alcance atinge o microcosmos em que habitam suas vítimas. Quantos cancelamentos inexplicáveis, quantas amizades rompidas, quantas portas fechadas, e tudo por causa dessas máquinas portáteis, mas devastadoras de vidas. Confrontar seus construtores, operadores e patrocinadores é importantíssimo, mas é preciso dizer que os consumidores são tão responsáveis quanto e que este produto só faz sucesso porque há um público ávido por consumi-lo.


Nenhum comentário: