Se quiserem chamar de sentimentalismo nostálgico, sintam-se à vontade, mas hoje tenho orgulho apenas do nosso passado. Apraz-me saber que a origem dos batistas vincula-se às lutas em defesa da autonomia e da competência do indivíduo, do batismo voluntário, da eclesiologia congregacional, da liberdade religiosa e da separação entre Igreja e Estado - lutas que ajudaram a construir os ideais de modernidade e democracia dos nossos dias.
Orgulho-me dos batistas de antigamente que protagonizaram eficazes campanhas de evangelização e avivamento nos locais onde se instalavam, revolucionaram os conceitos missiológicos (a ponto de encontrarmos no planejamento estratégico de William Carey, para sua atuação na Índia, os princípios essenciais que hoje direcionam as ações missionárias modernas), marcaram a arte e a literatura (a exemplo da obra O Peregrino, de John Bunyan, considerado um clássico mundial), enriqueceram a música e a liturgia dos cultos (como no caso de hinários que se tornaram referências entre as diversas denominações), mantêm programas em defesa dos direitos humanos nos países onde há perseguição política e religiosa (basta lembrar a firme atuação da Aliança Batista Mundial nesta área) e outras contribuições similares para a sociedade contemporânea.
Sinto orgulho das empreitadas missionárias pioneiras de Eurico Nelson e Salomão Ginsburg. Orgulho do Maracanã repleto de batistas do mundo inteiro. Orgulho de Diretriz Evangélica, movimento de engajamento sócio-político nos tempos da repressão militar. Orgulho da literatura doutrinário-teológica publicada pela antiga Junta de Educação Religiosa. Orgulho de Rubens Lopes à frente da Campanha Nacional de Evangelização, de David Malta na reitoria do Seminário do Sul e da respeitabilidade de homens da estirpe de Reis Pereira, David Gomes, João Fílson Soren, Himaim Lacerda, Antônio Neves de Mesquita, Bem Oliver, Éber Vasconcelos, Falcão Sobrinho, entre outros, tantos outros.
Tenho orgulho, entretanto, apenas do passado. Confesso que, voltando os olhos para o presente e, em especial, para a Convenção Batista Carioca, à luz da atual e indisfarçável mediocridade reinante, carrego comigo tão-somente a vergonha e a desesperança. Tenho vergonha de ver minha igreja participando de uma Convenção com esta face desfigurada. Vergonha de tentar justificar, diante da congregação que pastoreio, a nossa cada vez mais injustificável cooperação financeira. Tenho vergonha de ver alguns quadros e instituições denominacionais tomados por aqueles que possuem o único e despudorado objetivo de obter benefícios pessoais. Tenho vergonha de saber que não poucos, para permanecer no poder às custas do sacrifício de princípios éticos e de valores bíblicos, prestam-se a manipular e manobrar pessoas e situações. Tenho vergonha de ver que, motivados por rancores ímpios e desejos mesquinhos de vingança, quando não pelo inescrupuloso empenho em constranger, intimidar e ameaçar, recorrem a instâncias judiciais seculares e, o que é pior e mais desalentador, acham-se cobertos de razões - as falsas razões que brotam de insanas irracionalidades. Tenho vergonha de participar das reuniões do conselho administrativo e das assembléias convencionais, onde - numa patética passarela de encenações e dissimulações - desfilam a mentira, a ironia, a desfaçatez, a astúcia da serpente, a hipocrisia dos fariseus e a violência dos gananciosos. Tenho vergonha de uma denominação que, apesar de estar inserida numa sociedade com graves crises e problemas complexos, aos quais deveria responder com marcantes ações de influência ética, prefere dar amplo espaço a disputas mesquinhas, à estúpida chama da fogueira das vaidades, à repartição implacável dos seus despojos, optando por rodear em torno do seu próprio umbigo, enclausurar- se em seu próprio casulo e tornar-se assim inútil porque fútil, tão fútil e inútil quanto estruturas outras que o tempo fez o favor histórico de enfraquecer, desmontar e extinguir. Tenho vergonha da nossa presença na educação secular, longe, muito longe dos propósitos originais, servindo hoje tão-somente de motivo para discórdias e divisões, causando prejuízos aos cofres denominacionais e atendendo interesses menos nobres, sem conseguir comprovar alguma excelência educacional, sem influenciar de modo evidente os setores acadêmicos e sem qualquer contribuição intelectual notória para a comunidade científica. A meu ver, colégios convencionais em tais condições deveriam ser fechados, desocupados e vendidos, para que as igrejas possam preocupar-se, de fato, com sua missão precípua de evangelizar e testemunhar, livres de empecilhos morais que desacreditam a pregação. Tenho vergonha ao descobrir que a Convenção Carioca nada mais tem a dizer à sociedade atual, não só porque seus discursos estão completamente desvinculados das práticas, não apenas porque, normalmente, inteligência e denominação não caminham de mãos dadas, mas especialmente porque está vazia, ficou oca, reveste-se de uma lamentável mediocridade, tornou-se uma figueira seca - que só serve para ser cortada e queimada - e sal sem sabor - que não serve senão para ser pisado. E como tem sido pisada, e como tem sido desprezada a nossa pobre, a nossa paupérrima Convenção por quem passa com a mínima capacidade de reflexão e discernimento.
Mas não é só vergonha o que sinto - antes fosse. É desesperança. Não soubemos administrar a herança que recebemos. Não somos dignos da nossa história. Não merecemos o nome que temos. E não vejo horizonte adiante. As igrejas até que vão bem - crescem de modo razoável, contribuindo de alguma forma para o testemunho cristão na sociedade. Mas a estrutura denominacional faliu. O modelo esgotou-se. Tornou-se um câncer de tumores fétidos e irreversíveis. É odre velho - como referiu-se Jesus às antigas instituições farisaicas - e não adianta querer enchê-lo com vinho novo. Qualquer mediano conhecedor das Escrituras entende que Cristo não fundou qualquer igreja institucional (católica, anglicana, luterana, seja qual for). Cristo fundou um conceito de igreja. São corpo de Cristo as igrejas que permanecem leais a esse conceito. As demais, não passam de ajuntamentos religiosos. As denominações também não foram criadas pelo Senhor: nascem como fatos sociais resultantes de determinados contextos históricos. Em suas posturas e ações, podem expressar ou não os valores do Reino. De modo geral, não expressam. Como aconteceu a outras tantas denominações ao longo desses vinte séculos de cristianismo, os batistas surgiram, cresceram e agora, em muitos países, vemos sinais claros do seu melancólico ocaso. A Convenção Carioca é um exemplo.
Restam-nos a nostalgia e o lamento. Parece que, cansado, Deus abandonou-nos à mercê das nossas próprias inconseqüências. Afinal, não somos os únicos a quem Ele pode usar para a expansão do seu Reino. Há quem, com certeza, seja mais útil e fiel aos seus propósitos. Bem-vindos, irmãos e irmãs batistas cariocas, ao nosso particularíssimo cativeiro babilônico.
Pr. Carlos Novaes
Orgulho-me dos batistas de antigamente que protagonizaram eficazes campanhas de evangelização e avivamento nos locais onde se instalavam, revolucionaram os conceitos missiológicos (a ponto de encontrarmos no planejamento estratégico de William Carey, para sua atuação na Índia, os princípios essenciais que hoje direcionam as ações missionárias modernas), marcaram a arte e a literatura (a exemplo da obra O Peregrino, de John Bunyan, considerado um clássico mundial), enriqueceram a música e a liturgia dos cultos (como no caso de hinários que se tornaram referências entre as diversas denominações), mantêm programas em defesa dos direitos humanos nos países onde há perseguição política e religiosa (basta lembrar a firme atuação da Aliança Batista Mundial nesta área) e outras contribuições similares para a sociedade contemporânea.
Sinto orgulho das empreitadas missionárias pioneiras de Eurico Nelson e Salomão Ginsburg. Orgulho do Maracanã repleto de batistas do mundo inteiro. Orgulho de Diretriz Evangélica, movimento de engajamento sócio-político nos tempos da repressão militar. Orgulho da literatura doutrinário-teológica publicada pela antiga Junta de Educação Religiosa. Orgulho de Rubens Lopes à frente da Campanha Nacional de Evangelização, de David Malta na reitoria do Seminário do Sul e da respeitabilidade de homens da estirpe de Reis Pereira, David Gomes, João Fílson Soren, Himaim Lacerda, Antônio Neves de Mesquita, Bem Oliver, Éber Vasconcelos, Falcão Sobrinho, entre outros, tantos outros.
Tenho orgulho, entretanto, apenas do passado. Confesso que, voltando os olhos para o presente e, em especial, para a Convenção Batista Carioca, à luz da atual e indisfarçável mediocridade reinante, carrego comigo tão-somente a vergonha e a desesperança. Tenho vergonha de ver minha igreja participando de uma Convenção com esta face desfigurada. Vergonha de tentar justificar, diante da congregação que pastoreio, a nossa cada vez mais injustificável cooperação financeira. Tenho vergonha de ver alguns quadros e instituições denominacionais tomados por aqueles que possuem o único e despudorado objetivo de obter benefícios pessoais. Tenho vergonha de saber que não poucos, para permanecer no poder às custas do sacrifício de princípios éticos e de valores bíblicos, prestam-se a manipular e manobrar pessoas e situações. Tenho vergonha de ver que, motivados por rancores ímpios e desejos mesquinhos de vingança, quando não pelo inescrupuloso empenho em constranger, intimidar e ameaçar, recorrem a instâncias judiciais seculares e, o que é pior e mais desalentador, acham-se cobertos de razões - as falsas razões que brotam de insanas irracionalidades. Tenho vergonha de participar das reuniões do conselho administrativo e das assembléias convencionais, onde - numa patética passarela de encenações e dissimulações - desfilam a mentira, a ironia, a desfaçatez, a astúcia da serpente, a hipocrisia dos fariseus e a violência dos gananciosos. Tenho vergonha de uma denominação que, apesar de estar inserida numa sociedade com graves crises e problemas complexos, aos quais deveria responder com marcantes ações de influência ética, prefere dar amplo espaço a disputas mesquinhas, à estúpida chama da fogueira das vaidades, à repartição implacável dos seus despojos, optando por rodear em torno do seu próprio umbigo, enclausurar- se em seu próprio casulo e tornar-se assim inútil porque fútil, tão fútil e inútil quanto estruturas outras que o tempo fez o favor histórico de enfraquecer, desmontar e extinguir. Tenho vergonha da nossa presença na educação secular, longe, muito longe dos propósitos originais, servindo hoje tão-somente de motivo para discórdias e divisões, causando prejuízos aos cofres denominacionais e atendendo interesses menos nobres, sem conseguir comprovar alguma excelência educacional, sem influenciar de modo evidente os setores acadêmicos e sem qualquer contribuição intelectual notória para a comunidade científica. A meu ver, colégios convencionais em tais condições deveriam ser fechados, desocupados e vendidos, para que as igrejas possam preocupar-se, de fato, com sua missão precípua de evangelizar e testemunhar, livres de empecilhos morais que desacreditam a pregação. Tenho vergonha ao descobrir que a Convenção Carioca nada mais tem a dizer à sociedade atual, não só porque seus discursos estão completamente desvinculados das práticas, não apenas porque, normalmente, inteligência e denominação não caminham de mãos dadas, mas especialmente porque está vazia, ficou oca, reveste-se de uma lamentável mediocridade, tornou-se uma figueira seca - que só serve para ser cortada e queimada - e sal sem sabor - que não serve senão para ser pisado. E como tem sido pisada, e como tem sido desprezada a nossa pobre, a nossa paupérrima Convenção por quem passa com a mínima capacidade de reflexão e discernimento.
Mas não é só vergonha o que sinto - antes fosse. É desesperança. Não soubemos administrar a herança que recebemos. Não somos dignos da nossa história. Não merecemos o nome que temos. E não vejo horizonte adiante. As igrejas até que vão bem - crescem de modo razoável, contribuindo de alguma forma para o testemunho cristão na sociedade. Mas a estrutura denominacional faliu. O modelo esgotou-se. Tornou-se um câncer de tumores fétidos e irreversíveis. É odre velho - como referiu-se Jesus às antigas instituições farisaicas - e não adianta querer enchê-lo com vinho novo. Qualquer mediano conhecedor das Escrituras entende que Cristo não fundou qualquer igreja institucional (católica, anglicana, luterana, seja qual for). Cristo fundou um conceito de igreja. São corpo de Cristo as igrejas que permanecem leais a esse conceito. As demais, não passam de ajuntamentos religiosos. As denominações também não foram criadas pelo Senhor: nascem como fatos sociais resultantes de determinados contextos históricos. Em suas posturas e ações, podem expressar ou não os valores do Reino. De modo geral, não expressam. Como aconteceu a outras tantas denominações ao longo desses vinte séculos de cristianismo, os batistas surgiram, cresceram e agora, em muitos países, vemos sinais claros do seu melancólico ocaso. A Convenção Carioca é um exemplo.
Restam-nos a nostalgia e o lamento. Parece que, cansado, Deus abandonou-nos à mercê das nossas próprias inconseqüências. Afinal, não somos os únicos a quem Ele pode usar para a expansão do seu Reino. Há quem, com certeza, seja mais útil e fiel aos seus propósitos. Bem-vindos, irmãos e irmãs batistas cariocas, ao nosso particularíssimo cativeiro babilônico.
Pr. Carlos Novaes
Um comentário:
Condoi o coração ao deparar-me com essa realidade chamada "batista", pois o mergulho original da palavra batismo,de onde surgiu a palavra batista é realmente alarmante.
O q aconteceu? Ué, vc não sabe? Estamos sim afogados na insensível doença chamada alienação..At qdo?
Profundo é o "oceano", mas todos preferem o "sono". Acordar requer sair do "escândalo" que vexame! At qdo?
Ora bolas, eu creio que só at Cristo voltar!
Ele sim vai entregar o resgate de tudo que faltou em todos.
A quem divulgou o texto un forte abraço!
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